“Poesia da Sexta” – CCXCII
Carta do Vovô VII
Belo Horizonte, 20/03/2020
Ei Sarinha, boniteza do vovô
Hoje você completa dez meses de vida. Dez meses neste mundo. As coisas por aqui não andam muito boas. Tem horas que a gente quase perde as esperanças de que seremos capazes de oferecer um mundo melhor. Para que todos vocês, nascidos agora, tenham uma vida digna e plena de felicidade.
Quando você estiver na escola, certamente os manuais de história mundial narrarão a grave pandemia que se passa nos dias atuais. Uma infecção (um dodói sério) que milhões de pessoas vão contrair. Por um bichinho chamado coronavirus.
Sobre isso, quero lhe dizer que todos aqui seguem o que você nos pede tão carinhosamente, através do papai Felipe e da mamãe Manu. Vovô Geraldo, vovó Márcia, vovó Claudete e eu estamos quietinhos em casa, sempre esperando ver sua carinha sapeca e feliz na telinha, a nos ensinar: “calma aí pessoal que isso já vai passar e tudo dará certo, com a bênção do Papai do Céu”. A bisa Vitória está bem em sua casinha. Mas a gente não pode ir lá visitá-la, para ela não ficar mais dodói ainda. O bisa Galvão segue quietinho em casa também. A Dindinha e o Dindo estão trabalhando de casa, como o papai Felipe, para não dar mole para esse bichinho malvado.
Quero muito que você venha nos visitar. Mas acho que, por enquanto, vamos ter que matar a saudade só pela telinha. Adoro ver você. Toda vez que lhe vejo, fortalecem em mim a esperança e a coragem de enfrentar o que for preciso.
Você também vai aprender – com a história e a vida – que os momentos difíceis trazem muitas lições e muitos resgates para a alma das pessoas.
Nas dificuldades, lembramos que os interesses coletivos devem prevalecer sobre os individuais. Sobretudo quando o que está em jogo é a vida de cada um e de todos ao mesmo tempo. Com essa lembrança, resgatamos a solidariedade.
Quase sempre, diante de uma pandemia, toda a humanidade – por mais dominante, sábia e desenvolvida que seja – fica ameaçada em sua existência – por um bichinho minúsculo capaz de entrar dentro da gente e bagunçar todas as nossas defesas e todo o funcionamento dos nossos órgãos. Então, lembramos de nossa pequenez humana, de nossa fragilidade.
O tio vovô Gabriel Bicalho, colega de BB, amigo poeta e confrade do vovô João, escreveu lindamente dia desses:
Ah!, minúsculo corona,
vírus disperso e fecundo:
és gigante que destrona
os imundos reis do mundo!
Nessas situações, resgatamos o senso de humanidade, o senso de fraternidade. Resgatamos o senso de humildade, em especial. Somos inteligentes, mas não somos os donos do mundo e nem autossuficientes. Precisamos uns dos outros.
Um bichinho minúsculo a nos ameaçar tão gravemente. Numa situação dessas resgatamos o valor da vida. Nas coisas mais simples: no respirar, no andar, no ouvir, no falar, no tocar, no sentir. No ser livre para sair de casa, na comidinha gostosa da mamãe. No sorriso das crianças, no voo breve dos passarinhos. No azul do céu, na primavera, no frescor da brisa. Constatamos que a vida é breve e frágil, mas cheia de boas razões para ser vivida com significado e leveza, a cada dia, em comunhão intensa com nossos irmãozinhos de toda espécie e natureza.
Bem, já escrevi muito. Está na hora de dormir.
Tchauzinho para você, com uma trovinha, como de costume, desejando que nos vejamos logo para brincar e curtir a vida como deve ser: plena de amor, fé e esperança.
Sarinha! Seus dez meses.
Ô mundo conturbado.
Ensina-nos – mil vezes –
que viver é sagrado…
Parabéns por mais um mesversário. Papai do Céu lhe abençoe e proteja hoje e sempre.
Beijin
Vovô João
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João Gimenez é escritor e poeta. Garimpeiro de palavras.
Tem três livros publicados. A completude do verso (2013 – Editora 3i), Versos Velados (2015 – Editora 3i) e O céu, a lua e as estrelas (2019 – Editora Aldrava, Letras e Artes).
Com O céu, a lua e as estrelas, João Gimenez foi premiado em 3o. lugar no Concurso Internacional de Literatura da UBE/RJ – União Brasileira de Escritores – Rio de Janeiro, na modalidade Aldravia, Prêmio Gabriel Bicalho.
É membro efetivo da ALACIB – Academia de Letras, Artes e Ciências Brasil – Mariana – MG e da SBPA – Sociedade Brasileira dos Poetas Aldravianistas.
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