“Poesia da Sexta – CCCXCVI
Se eu pudesse escrever para o meu avô, penso que escreveria assim. Não como criança apenas. Mas como um velhinho que chega ao tempo do querer ser o que já fora. Mas também o que deixou de ser. Depois de viver as tantas experiências de descoberta, desilusão, entusiasmo. Entre o desalento e a esperança. Escreveria como João Gimenez, mas na perspectiva de Sarinha, minha netinha querida. Como se eu fosse ela. Ou como se ela fosse eu. Nem sei dizer o que vem primeiro. Só sei que nos últimos meses tivemos uma oportunidade intensa de conviver e nos conhecer mais, como ainda não havia ocorrido entre nós. Sem racionalizar nada. Assim! Só ao acaso. No rol imenso das possibilidades.
Então, aí vai uma cartinha do vovô diferente. Sem número. Única. Nas palavras minhas do que penso possam ser uma tradução do que Sarinha e eu vivemos nesses dias…
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Carta da Sarinha para o vovojão
San Ramon – CA/USA, 04 de janeiro de 2022
Ei vovojão
Tivemos, nesses meses, experiências vividas intensamente. Dessas de ficar na lembrança. Sempre. Para mim e para você. Aproximação. Presença. Carinho. Companhia. Cuidado. Colo. Amor. Descobertas e emoções mútuas.
Muitas brincadeiras e algumas broncas. Não suas a mim. Mas minhas a você. Principalmente quando você ficava no celular ou despistava de mim para fugir com o papai, sem me levar para os bares da vida. Ainda vingarei vocês por isso. Vovódete me falou que você já fez o mesmo com a Didi Dedé quando ela era ainda criancinha como eu. Você não aprende não?!
Broncas à parte, fico pensando de como você e vovódete curtiram estar mais próximos a mim, da nossa casinha, com o papai e a moomy. Ainda mais, em estarem comigo para a chegada da sister Lily, quando moomy e papai saíram de casa para trazê-la a esta nossa vida. Da mesma forma que vocês estiveram em meu nascimento para este mundo. Presentes. E a “vovómarcia” também, do mesmo modo, com o mesmo amor e a mesma alegria. Sei que para ela e para moomy – para todos nós – o ano de 2021 foi muito difícil. Vovogê virou estrelinha…
Mas, a vida segue. Embora eu não saiba ainda compreender coisas como essa que os vovôs e vovós sempre dizem, repetidamente. Para mim, a vida não segue nada. A vida é! Simplesmente.
Eu quero lhe dizer que eu também gostei muito de acordar todos os dias, por meses, e ter certo que vocês estariam aqui, prontos a alegrar, cuidar, amar, conviver. Minha mais longa e bela convivência com vocês. Viva o amor de netas e netos por seus vovôs e vovós. “Amor que não se mede”. Amor que é. Apenas. Como a vida…
Eu ainda nem sei escrever. Mas você – meu vovojão, poeta que é – fica pensando umas coisas que ainda não compreendo mas já sinto. Emoções que viajam livres dos seus olhos para os meus. Sentimentos que viram palavras que respiram, inspiram, aspiram. E se tornam vida. Por meio de mim. E eu, então, escrevo pelas palavras que nascem desse amor tão belo de vovôs e vovós por seus netinhos e suas netinhas. Reciprocidade. Espontânea. Natural. Despretensiosa.
A Lily ainda está muito novinha, mas já nos reconhece a todos. Você, vovojão, sempre me coloca por perto dela para, juntos, tentarmos ganhar aquele riso lindo, com covinha, boquinha de charme e tudo de puro, belo e bom. A alegrar a alma da gente, além de uma conta que talvez nem mereçamos, como filhinhos rebeldes do Papai do Céu.
Hoje, na sua despedida, a poesia é minha.
Ok?!
Escrevi esse poeminha como quem escreve por meio de seus sentimentos. Por você, vovô. E por mim. Alguém que já começa a aprender, aos poucos, pelas mãos da sensibilidade. E a construir dela os significados maiores da transcendência. Como gostam os vovôs e as vovós de fazer quando dão voz e vez aos pensamentos, pela mais pura arte da palavra. A poesia. Palavra bordada de amor e beleza. De fé e esperança.
Valeu vovô. Volte mais vezes!
Beijos da Sarinha e da Lily
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nenhum vovô fala sério
faz fantasia… somente
nenhum vovô é espelho
mas se reflete na gente
nenhum vovô é mistério
se acena dá um presente
nenhum vovô fica velho
vira criancinha experiente
nenhum vovô morre: etéreo
sobe estrelinha ao sol poente
Poesia da Sexta – CDXXXVIII um oceano de mares e o ciano dos ares o profano tem seus altares CDXXXVIII […]
os rios correm mortos os dias passam tortos e a vida sucumbe à margem dos rios dos dias da viagem […]
sou medo, ora… navego o escuro :a fé que ancora é a que procuro sou medo joão gimenez 11/08/2020
João Gimenez é escritor e poeta. Garimpeiro de palavras.
Tem três livros publicados. A completude do verso (2013 – Editora 3i), Versos Velados (2015 – Editora 3i) e O céu, a lua e as estrelas (2019 – Editora Aldrava, Letras e Artes).
Com O céu, a lua e as estrelas, João Gimenez foi premiado em 3o. lugar no Concurso Internacional de Literatura da UBE/RJ – União Brasileira de Escritores – Rio de Janeiro, na modalidade Aldravia, Prêmio Gabriel Bicalho.
É membro efetivo da ALACIB – Academia de Letras, Artes e Ciências Brasil – Mariana – MG e da SBPA – Sociedade Brasileira dos Poetas Aldravianistas.
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