29 de outubro de 2022Categoria: Cartinhas do Vovô

Cartinha do vovô XVIII

Belo Horizonte, 29/10/2022

Ei Lilita

Quando fui embora de sua casinha, em janeiro, você esboçou um risinho com um cantinho da boca dos mais espontâneos e lindos. Ficou guardado aqui neste coração de vovô. Você tão novinha, de pouco mais de dois meses.

Alguns meses se passaram e você veio me visitar aqui no Brasil. Já maiorzinha. Mais interativa e consciente do mundinho de amor em que você vive e cresce, em estatura e Graça. Balbuciando as primeiras palavrinhas aprendidas pela observação atenta. Foi assim que você aprendeu com o vovô a palavra “Teteia”. No colo, observando com uma atenção infante o movimento da minha boca.

Alguém me perguntou. Mas o que significa “Teteia”? Eu não sei. Apenas lembro que fiz isso com o seu papai Felipe e sua titia DidiDedé. E esse seu Teteia, pronunciado a seu modo, também está aqui guardado em meu coração. A primeira palavra que ensinei a você ficará aqui, comigo, para sempre.

E agora, a completude do primeiro aninho de vida. Com mais uma novidade também de nunca esquecer: seus primeiros passinhos. Ainda um pouquinho trôpegos, mas confiantes de onde podem levá-la.

Notei uma coisa daqui de longe. Ao que ainda está aprendendo (como andar), você dedica total concentração. Troca a agilidade pela cadência dos movimentos. Mas, se senta no chão e segue o caminho qual gatinho, segue na maior rapidez. E troca cadência por agilidade.

Será sempre assim em sua vida, Lilita. Observando, tentando fazer, aprendendo, errando. E ganhando desenvoltura ao aplicar o que aprendeu. Assim desejo em meu coração de vovô estudioso e curioso do que ainda não sabe. Que você seja uma aprendiz, amante incansável da dúvida e do conhecimento. Da ciência das coisas, dos movimentos, das gentes todas deste mundão comunitário em que você vive.

E cá estou lhe escrevendo de novo para lhe contar que ando resistindo muito a aprender a ser vovô de netinhas distantes. Vovojão não é só estudioso não. É também de uma teimosia danada. E essa de resistir a aprender a ser vovô de netinhas distantes é a principal delas, nesta minha fase de vida.

Não foi por acaso que comecei essa cartinha registrando três momentos dessa sua vidinha linda que está apenas a começar. Mas que carrega um turbilhão de mudanças que estão constituindo você, a cada ocorrência. E do que elas deixarão de marca ao longo de uma vida inteira. Eu já conheci três Emily. A Emily nascitura. A Emily que já percebe que o mundo ao seu redor é bem maior que o quentinho do ventre da mamãe Manu. E a Emily que se percebe livre para ir aonde quiser, seguindo seus próprios passinhos.

No entanto, esse seu vovojão, já não carrega em si esse turbilhão tão dinâmico de descobertas transformadoras. Em nossa constituição humana, eu já estou mais para ‘off’. E você é só ‘on’, em todos os movimentos. Em tudo que faz.

Daí vem minha teimosia. Misturada a uma saudade inusitada. Saudade do que não se vê e nem se vive, pela distância que nos separa. Tenho uma saudade esquisita. De reviver algo que não vivi. De assistir ao filme de sua existência, em cada partícula de segundo dessa sua ‘metamorfose ambulante’. Assim teria a felicidade de dizer o que todo vovô deseja: eu vi essa minha netinha nascer e se fazer pessoa, a cada novidade, a cada descoberta, a cada aprendizado. Sempre por perto.

Mas sigo compreendendo essas coisas da modernidade. Ou tentando compreender o mais que alcanço. E vejo coisas boas que enchem meu coração da mais genuína alegria. A cada encontro virtual, durante a semana. E disso vou formando expectativas boas em minh’alma.

A do reencontro: do toque, do olho no olho, do colinho de vovô. Cheio de um abraço que mal cabe em meu peito de tanta saudade e amor.

A dos novos aprendizados que trocamos em nossa atmosfera de amor única. A maior que já fui capaz de ter. A do amor mais gratuito e mútuo que já vivi: o amor de vovô.

A da alegria da espera. Em tê-la comigo o dia inteirinho. Ao meu lado, para vivenciar uma pequena amostra do turbilhão dos movimentos transformadores de sua primeira infância.

Parabéns pelo seu primeiro aninho de vida. Cheio de fé, amor e esperança. Você – junto com a Sarita – são a maior alegria de nossas vidas. Entre visitas, chegadas, partidas e saudades.

O poeminha de hoje, no ano um de sua vida, não é inédito. Escrevi em 2015 para a sua titia DidiDedé da Sarita. Chama sintagma. Uma palavra que você ainda não sabe mas vai aprender. Igual a “Teteia” que você aprendeu comigo. Aí vai…

entre
lembrança
e esperança

uma
presença

um amor
um sonho
uma crença

andança
sapiência

nisso
a vida
consiste

mais alegre
do que triste

É o que desejo a você, Emily. Paz e bem! Hoje e sempre!

Bençãos do vovojão. Beijinhos à Sarita, papai e mamãe.

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Sobre o autor

João Gimenez é escritor e poeta. Garimpeiro de palavras.

Tem três livros publicados. A completude do verso (2013 – Editora 3i), Versos Velados (2015 – Editora 3i) e O céu, a lua e as estrelas (2019 – Editora Aldrava, Letras e Artes).

Com O céu, a lua e as estrelas, João Gimenez foi premiado em 3o. lugar no Concurso Internacional de Literatura da UBE/RJ – União Brasileira de Escritores – Rio de Janeiro, na modalidade Aldravia, Prêmio Gabriel Bicalho.

É membro efetivo da ALACIB – Academia de Letras, Artes e Ciências Brasil – Mariana – MG e da SBPA – Sociedade Brasileira dos Poetas Aldravianistas.

Contatos com o autor: